Monthly Archives: janeiro 2020

Papa: uma sociedade é “civil” se combate a “cultura do descarte”

By | Aconteceu... | No Comments

Papa: uma sociedade é “civil” se combate a “cultura do descarte”

 

Nesta quinta-feira (30), ao receber a Congregação para a Doutrina da Fé, o Papa Francisco falou do valor intangível da vida humana, do cuidado dos doentes nas fases críticas e terminais, e da necessidade de reescrever a “gramática” ao assumir e cuidar da pessoa que sofre. Presente na audiência no Vaticano, o arcebispo de Belo Horizonte e presidente da CNBB, Dom Walmor Oliveira de Azevedo.

 

O Papa Francisco recebeu em audiência na manhã desta quinta-feira (30), na Sala Clementina, no Vaticano, os participantes da assembleia plenária da Congregação para a Doutrina da Fé, inclusive, o arcebispo de Belo Horizonte e presidente da CNBB, Dom Walmor Oliveira de Azevedo.

A preciosidade da vida humana - Foto: Vatican Media

A preciosidade da vida humana – Foto: Vatican Media

 

As palavras do Pontífice foram dedicadas ao cuidado das pessoas nas fases críticas e terminais da vida, além da urgência de “converter o olhar do coração” à luz da compaixão. O Papa sublinhou o bem que fazem os asilos, onde se pratica a “terapia da dignidade”. Francisco exortou, então, a prosseguir com firmeza o estudo em relação à revisão das normas sobre delicta graviora, contidas no Motu proprio “Sacramentorum sanctitatis tutela”, de João Paulo II, para seguir na estrada da transparência e do respeito da dignidade dos menores.

 

A doutrina, uma realidade dinâmica

 

O Pontífice começou o discurso agradecendo pelo trabalho desenvolvido a serviço da Igreja na promoção e tutela da integridade da doutrina cristã – que não é “um sistema rígido e fechado em si” e nem mesmo “uma ideologia”. O Papa descreveu o conceito como sendo uma “realidade dinâmica”, que se “renova de geração em geração” e se resume “num rosto, num corpo e num nome: Jesus Cristo Ressuscitado”.

 

“Graças ao Senhor Ressuscitado, a fé se abre ao próximo e às suas necessidades, daquelas menores até as maiores. Por isso, a transmissão da fé exige que se considere o seu destinatário, que se conheça ele e o ame efetivamente.”

 

O tema da preciosidade da vida humana

 

O Papa Francisco então discorreu sobre o contexto sociocultural vivido atualmente com o enaltecimento da “eficiência e utilidade” da vida humana e a “perda dos valores autênticos” em detrimento aos “deveres imperativos da solidariedade e da fraternidade” que rendem a vida preciosa. O Pontífice explicou:

“Na realidade, uma sociedade merece a qualificação de ‘civil’ se desenvolve os anticorpos contra a cultura do descarte; se reconhece o valor intangível da vida humana; se a solidariedade é efetivamente praticada e protegida como fundamento da convivência. Quando a doença bate à porta da nossa vida, aflora sempre mais em nós a necessidade de ter próximo alguém que nos olhe nos olhos, que segure a mão, que manifeste a sua ternura e cuide de nós, como o Bom Samaritano da parábola evangélica (Mensagem para XXVIII Dia Mundial do Enfermo, 11/02/2020).”

 

A “gramática” da cura

 

O Papa então recordou o quanto é importante a compaixão, “um refrão” no Evangelho, e a presença de um Bom Samaritano, uma “plataforma humana de relações”, que abrem à esperança, bálsamo para acalmar o “desconforto emotivo” e a “angústia espiritual”. “Não abandonar jamais ninguém”, sublinhou Francisco, “em presença de maus incuráveis. A vida humana, devido o seu destino eterno, conserva todo o seu valor e toda a sua dignidade em qualquer condição, inclusive de precariedade e fragilidade, e, como tal, é sempre digna da máxima consideração”.

 

“O tema do cuidado dos doentes, nas fases críticas e terminais da vida, chama em causa a tarefa da Igreja de reescrever a ‘gramática’ do assumir e do cuidar da pessoa que sofre. O exemplo do Bom Samaritano ensina que é necessário converter o olhar do coração porque, muitas vezes, quem olha não vê. Por quê? Porque falta a compaixão. Sem a compaixão, quem olha não se sente envolvido naquilo que observa e passa além; ao contrário, quem tem o coração compassivo é tocado e envolvido, se detém e cuida.”

 

A terapia da dignidade

 

“Quem, no caminho da vida, acendeu também apenas uma chama na hora escura de alguém não viveu em vão”: Francisco citou Santa Teresa de Calcutá para desenhar “o estilo da proximidade e da partilha”, “tornando mais humano o morrer”. Uma tarefa importante que hoje realizam os asilos.

 

“A esse propósito, penso quanto bem fazem os asilos para os cuidados paliativos, onde os doentes terminais são acompanhados com um qualificado apoio médico, psicológico e espiritual, para que possam viver com dignidade, confortados da proximidade das pessoas queridas, a fase final da vida terrena deles. Desejo que tais centros continuem a ser lugares nos quais se pratiquem com empenho a ‘terapia das dignidade’, alimentando assim o amor e o respeito pela vida.”

 

Rigor e transparência

 

O Pontífice ainda expressou apreço pelo estudo iniciado sobre a revisão das normas sobre os delicta graviora, contidas no Motu proprio “Sacramentorum sanctitatis tutela”, de São João Paulo II. Um empenho que se coloca na direção de uma atualização da normativa para tornar mais eficazes os procedimentos à luz das novas situações e problemáticas do atual contexto sociocultural.

 

“Exorto vocês a prosseguir com firmeza nessa tarefa para oferecer uma contribuição válida num âmbito em que a Igreja está diretamente envolvida a prosseguir com rigor e transparência no tutelar a santidade dos Sacramentos e a dignidade humana violada, especialmente dos pequenos.”

 

Enfim, Francisco parabenizou o documento elaborado pela Pontifícia Comissão Bíblica sobre os temas fundamentais da antropologia bíblica que aprofunda “uma visão global do projeto divino, iniciado com a criação e que encontra a sua realização em Cristo, o Homem novo”, “a chave, o centro e o fim de toda a história humana”.

 

Benedetta Capelli, Andressa Collet – Cidade do Vaticano

Fonte: Vatican News

Papa: viver e julgar com o estilo misericordioso do cristão

By | Aconteceu... | No Comments

Papa: viver e julgar com o estilo misericordioso do cristão

 

O nosso estilo de vida, o nosso modo de julgar os outros deve ser plenamente cristão, isto é, generoso e repleto de amor, e não motivo de humilhações, porque com a mesma medida com a qual julgamos, também nós seremos julgados ao final da nossa existência. Foi o que evidenciou o Pontífice ao pronunciar a homilia na missa celebrada na Casa Santa Marta, comentando o Evangelho do dia, extraído de Marcos.

 

A página que o Evangelho de Marcos (Mc 2, 21-25) nos propõe hoje é rica de frases e conselhos de Jesus. O Papa Francisco escolhe uma para refletir na sua homilia na capela da Casa Santa Marta, num diálogo constante com os fiéis presentes: “Com a mesma medida com que medirdes, também vós sereis medidos”.

Papa Francisco na Casa Santa Marta - Foto: Vatican Media

Papa Francisco na Casa Santa Marta – Foto: Vatican Media

 

A medida do estilo cristão

 

Todos nós, afirmou o Papa, fazemos as contas com a vida, fazemos no presente e, sobretudo, faremos ao final da nossa existência, e esta frase de Jesus nos diz justamente “como será aquele momento”, isto é, como será o juízo.

 

Enquanto o trecho das Bem-aventuranças e o capítulo 25 do Evangelho de Mateus falam das “coisas que devemos fazer”, o Evangelho de hoje mostra como fazê-las, o estilo e a medida:

Com qual medida eu meço os outros? Com qual medida meço a mim mesmo? É uma medida generosa, repleta do amor de Deus ou é uma medida rasa? E com aquela medida eu serei julgado, não será outra: com aquela, aquela que eu faço. Qual é o nível em que coloquei a minha trave? Coloquei no alto? Devemos pensar nisso. E isso o vemos não só nas coisas boas ou más que fazemos, mas no estilo contínuo de vida.

 

O modelo do estilo cristão: Deus que humilha a si mesmo 

 

O Papa destacou que cada um de nós tem um estilo, “um modo de medir a si mesmo, as coisas e os outros” e será o mesmo que o Senhor usará conosco.  Portanto, explicou, quem mede com egoísmo, assim será medido; quem não tem piedade e que para subir na vida “é capaz de pisar na cabeça de todos”, será julgado do mesmo modo, isto é, “sem piedade”. O contrário disto é o estilo de vida do cristão, que Francisco assim propôs:

E como cristão eu me pergunto qual é a medida de referência, a medida de comparação para saber se estou num nível cristão, um nível que Jesus quer? É a capacidade de me humilhar, é a capacidade de sofrer as humilhações. Um cristão que não é capaz de carregar consigo as humilhações da vida, lhe falta algo. É um cristão de verniz ou de interesse. “Mas, padre, por que isto?”. Porque Jesus fez assim, ele mesmo se aniquiliou, assim diz Paulo: “humilhou-se a si mesmo e foi obediente até à morte, e morte de cruz!”. Ele era Deus, mas não se agarrou a isto: humilhou-se a si mesmo. Este é o modelo.

 

Mundanos, pecadores, empreendedores ou cristãos?

 

E como exemplo de um estilo de vida definido “mundano” e incapaz de seguir o modelo de Jesus, o Papa citou as “lamentações” que lhe referem os bispos quando têm dificuldades para transferir os sacerdotes de paróquia, porque consideradas “de categoria inferior” e não superior como eles aspiram e, portanto, vivem esta transferência como uma punição.

 

Francisco então comentou como reconhecer o “meu estilo”, o “meu modo de julgar” segundo o comportamento que assumo diante das humilhações: “um modo de julgar mundano, um modo de julgar pecador, um modo de julgar empresarial ou um modo de julgar cristão”:

Com a mesma medida com que medirdes, também vós sereis medidos”, a mesma medida. Se é uma medida cristã, que segue Jesus no seu caminho, (com) a mesma serei julgado, com muita, muita, muita piedade, com muita compaixão, com muita misericórdia. Mas se a minha medida é mundana e só uso a fé cristã – sim, faço, vou à missa, mas vivo como mundano – serei medido com esta medida. Peçamos ao Senhor a graça de viver de modo cristão e, sobretudo, de não ter medo da cruz, das humilhações, porque este é o caminho que Ele escolheu para nos salvar e isto é o que garante que a minha medida é cristã: a capacidade de carregar a cruz, a capacidade de sofrer alguma humilhação. 

 

 

Gabriella Ceraso – Cidade do Vaticano

Fonte: Vatican News

Santa Sé assegura apoio a soluções negociadas no Oriente Médio

By | Aconteceu... | No Comments

Santa Sé assegura apoio a soluções negociadas no Oriente Médio

 

O fio condutor das palavras do representante vaticano na Onu foi o recente discurso do Papa Francisco ao Corpo diplomático acreditado junto à Santa Sé, no qual o Santo Padre renovou sua preocupação por esta Região do mundo, de onde desde o início do ano continuam chegando notícias preocupantes.

 

O encarregado da missão do observador permanente da Santa Sé junto à Onu em Nova York, Mons. Fredrik Hansen, pronunciou-se com uma declaração na quarta-feira (22/01) no debate aberto no Conselho de Segurança das Nações Unidas, realizado nos dias 21 e 22 de janeiro sobre a situação no Oriente Médio e a questão palestina.

Jerusalém - Foto: Vatican Media

Jerusalém – Foto: Vatican Media

 

A Santa Sé assegura à comunidade internacional seu apoio para as iniciativas voltadas ao progresso das “soluções negociadas” e seu compromisso em favor da paz.

 

Diálogo e abordagem holística para crise da Região

 

O fio condutor de suas palavras foi o recente discurso do Papa Francisco ao Corpo diplomático acreditado junto à Santa Sé (09/01), no qual o Santo Padre renovou sua preocupação por esta Região do mundo, de onde desde o início do ano continuam chegando notícias preocupantes.

 

Em particular, a referência era o aumento da tensão entre o Irã e os EUA, bem como a crise no Iraque e Líbano, com o risco de “criar as bases de um conflito de mais vasta escala que todos queremos poder esconjurar”, afirmava.

 

Portanto, é da “máxima importância”, disse Mons. Hansen, que estes desafios sejam enfrentados com abordagem holística, bem como o compromisso da comunidade internacional no âmbito de um diálogo aberto e construtivo, baseado nos princípios nos quais as Nações Unidas foram construídas 75 anos atrás.

 

Manter o status quo sobre os lugares santos

 

O representante vaticano evidenciou ainda que a Santa Sé e o Papa continuam mantendo uma atenção particular pela Cidade Santa de Jerusalém, “a sua vocação de cidade da paz”. Em seguida, ressaltou o apelo, feito repetidamente também por esta Organização, a “manter o status quo dos lugares santos de Jerusalém, estimados por judeus, cristãos e muçulmanos”, e importantes para o patrimônio cultural de toda a família humana.

 

A urgência de que toda a comunidade internacional reconfirme seu compromisso em apoio ao processo de paz palestino-israelense tinha sido evidenciada com força pelo Papa no referido discurso ao Corpo diplomático. E o secretário geral no Relatório de dezembro dizia que a triste alternativa é que a situação é destinada a piorar constantemente, “diminuindo ulteriormente a viabilidade da solução de dois Estados” baseada nos limites territoriais de 1967.

 

Poderia aplicar-se a toda a região o que o Papa Francisco afirmou recentemente em relação a Israel e à Palestina. E no mundo inteiro – no limiar dos 75 anos da Onu –, onde muitas pessoas se encontram em dificuldade e esperam paz, segurança e prosperidade.

 

Síria e Iêmen

 

O olhar do Papa tinha se dirigido também à Síria. É preciso contrastar “o véu de silêncio que corre o risco de estender-se sobre a guerra que devastou” o país na última década, pedia o Papa exortando a encontrar soluções adequadas para permitir “ao amado povo sírio” reencontrar a paz e para a reconstrução”.

 

Mons. Hansen ressaltou que o Papa Francisco se preocupa também com a indiferença ao conflito no Iêmen, que está sofrendo uma das crises humanitárias mais graves da história recente.

 

Cidade do Vaticano

Fonte: Vatican Media

O Papa: batizar desde criança, para crescer com a força do Espírito Santo

By | Aconteceu... | No Comments

O Papa: batizar desde criança, para crescer com a força do Espírito Santo

 

A criança sai do Batismo com a força do Espírito Santo dentro de si: “o Espírito que a defenderá, a ajudará durante toda a vida. Por isso é tão importante batizá-las desde crianças, para que cresçam com a força do Espírito Santo”, disse o Papa Francisco na missa do domingo (12/01), festa do Batismo do Senhor.

 

Batizar um filho é um ato de justiça, para ele. E por qual motivo? Porque nós no Batismo lhe damos um tesouro, nós no Batismo lhe damos um penhor: o Espírito Santo. Foi o que disse o Papa Francisco na missa na manhã do domingo (12/01), festa do Batismo do Senhor, celebrada na esplêndida moldura da Capela Sistina, com o rito do Batismo das crianças.

Papa Francisco - Santa Missa na Festa do Batismo do Senhor - Foto: Vatican Media

Papa Francisco – Santa Missa na Festa do Batismo do Senhor – Foto: Vatican Media

 

Batizado de 32 recém-nascidos: 15 meninas e 17 meninos

 

De fato, como se dá habitualmente todos os anos nesta festa litúrgica que encerra o período do Natal, este ano o Santo Padre batizou 32 crianças: 15 meninas e 17 meninos.

 

Como Jesus foi batizar-se, assim também vocês trouxeram seus filhos para o Batismo, disse o Papa dirigindo-se aos pais.

 

Já no início da celebração, o diálogo de Francisco com os pais, padrinhos e madrinhas, com as perguntas próprias do rito do Batismo, e antes do sacramento, a renovação dos compromissos batismais.

 

Crescer com a luz do Espírito Santo

 

A criança sai do Batismo com a força do Espírito Santo dentro de si: “o Espírito que a defenderá, a ajudará durante toda a vida. Por isso é tão importante batizá-las desde crianças, para que cresçam com a força do Espírito Santo”, disse o Pontífice na homilia da celebração.

 

Está é a mensagem que eu gostaria de dar hoje a vocês, frisou Francisco. Vocês trazem seus filhos hoje, a fim de que tenham dentro o Espírito Santo. E cuidem para que “cresçam com a luz, com a força do Espírito Santo, através da catequese, da ajuda, do ensinamento, dos exemplos que vocês darão em casa. Esta é a mensagem”, acrescentou.

 

O choro de uma criança na igreja: uma bela oração

 

O Pontífice lembrou ainda que as crianças não estavam habituadas a vir à capela Sistina, num ambiente fechado um pouco quente, com tantas roupas para uma festa tão bonita. A qualquer momento poderão se sentir incomodadas e começarão a chorar. Não se assustem, deixem-nas chorar e gritar, se estiver com fome, pode amamentá-las, sempre em paz, disse ainda tranquilizando assim os pais, padrinhos e familiares presentes.

 

“É uma coisa bonita quando uma criança chora na igreja, é uma bela oração. Façam de modo que se sintam bem e sigamos adiante.” Não se esqueçam: as crianças levam o Espírito Santo dentro de si, reiterou por fim.

 

 

Raimundo de Lima – Cidade do Vaticano

Fonte: Vatican News

Apelo do Papa aos EUA e Irã: manter diálogo e autocontrole no respeito da legalidade

By | Aconteceu... | No Comments

Apelo do Papa aos EUA e Irã: manter diálogo e autocontrole no respeito da legalidade

“Renovo o meu apelo a todas as partes interessadas para que evitem um agravamento do conflito e mantenham acesa a chama do diálogo e do autocontrole”: este foi um dos trechos mais incisivos do discurso do Papa Francisco ao corpo diplomático acreditado junto à Santa Sé.

 

A crise entre Estados Unidos e Irã, as queimadas na Austrália, o impasse na Venezuela, a proteção do meio ambiente: todos os temas candentes da atualidade estiveram presentes num dos discursos mais aguardados do ano do Papa Francisco, isto é, ao corpo diplomático.

Apelo do Papa aos EUA e Irã - Foto: Vatican Media

Apelo do Papa aos EUA e Irã – Foto: Vatican Media

 

Na Sala Regia, estavam presentes os embaixadores dos 183 países com os quais a Santa Sé mantém relações diplomáticas, entre os quais o Brasil.

 

A longa e minuciosa análise do Pontífice partiu da palavra esperança: “Infelizmente, o novo ano aparece-nos constelado não tanto de sinais encorajadores, como sobretudo duma intensificação de tensões e violências. É precisamente à luz destas circunstâncias que não podemos cessar de esperar. E esperar exige coragem”.

 

América

A partir daí, o Papa lembrou cada uma de suas viagens apostólicas em 2019 para passar em resenha todos os continentes, começando pela América. No Panamá, em janeiro, ele visitou o país por ocasião da Jornada Mundial da Juventude.

 

A primeira lembrança de Francisco, porém, foi a de jovens abusados por membros do clero. “Trata-se de crimes que ofendem a Deus, causam danos físicos, psicológicos e espirituais às vítimas e lesam a vida de comunidades inteiras.” O Papa reiterou o compromisso da Igreja em debelar esta chaga e os esforços que vem fazendo, como, por exemplo, o encontro realizado em fevereiro com os presidentes de todas as Conferências Episcopais. E olhando para o futuro, citou o evento marcado para o próximo mês de maio, para um novo pacto educativo global.

 

Discurso do Papa Francisco ao corpo diplomático

 

Falar dos jovens é falar ainda do protagonismo que assumiram recentemente na defesa do meio ambiente.

 

A esse ponto, o Papa recordou o Sínodo Amazônico, realizado no Vaticano em outubro passado. “O Sínodo foi um evento essencialmente eclesial”, afirmou, mas “não podia eximir-se de abordar outras temáticas – a começar pela ecologia integral – que dizem respeito à própria vida daquela região tão vasta e importante para todo o mundo, uma vez que a floresta amazónica é um ‘coração biológico’ para a terra cada vez mais ameaçada”.

 

Ainda no continente americano, Francisco mencionou explicitamente a Venezuela e criticou as polarizações ideológicas, fazendo a seguinte análise:

“Em geral, os conflitos da região americana, embora possuindo raízes diferentes, são irmanados pelas profundas desigualdades, as injustiças e uma endêmica corrupção, bem como pelas várias formas de pobreza que ofendem a dignidade das pessoas. Por isso, os líderes políticos esforcem-se por restabelecer, urgentemente, uma cultura do diálogo em prol do bem comum e por fortalecer as instituições democráticas e promover o respeito pelo estado de direito, a fim de prevenir deslizes antidemocráticos, populistas e extremistas.”

 

Oriente Médio

 

Ao falar da viagem ao Marrocos e aos Emirados Árabes Unidos, ocasião em que assinou o Documento sobre a Fraternidade Humana com o Grande Imã de Al-Azhar, Ahmad al-Tayyeb, o Pontífice enquadrou uma das situações mais explosivas do planeta: o Oriente Médio e a península arábica. Síria, Iêmen, Líbia, Israel e Palestina foram citados, mas a atenção de Francisco se concentrou sobre o que aconteceu recentemente no Iraque:

“Particularmente preocupantes são os sinais que chegam de toda a região, após a recrudescência da tensão entre o Irã e os Estados Unidos que se arrisca, antes de tudo, a colocar a dura prova o lento processo de reconstrução do Iraque, bem como a criar as bases dum conflito de mais vasta escala que todos quereríamos poder esconjurar. Por isso, renovo o meu apelo a todas as partes interessadas para que evitem um agravamento do conflito e mantenham «acesa a chama do diálogo e do autocontrole», no pleno respeito da legalidade internacional.”

 

Europa

 

Depois, foi a vez da Europa e as viagens à Bulgária,  Macedônia do Norte e Romênia. O Papa não esqueceu dos migrantes e refugiados, constatando que o Mediterrâneo permanece um grande cemitério. Falou das tensões no Cáucaso, nos Bálcãs e na Ucrânia e citou uma série de datas comemorativas: os 45 anos da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE), os 70 anos do Conselho Europeu, os 30 anos da queda do Muro de Berlim:

“O Muro de Berlim permanece emblemático duma cultura da divisão que afasta as pessoas umas das outras e abre caminho ao extremismo e à violência. Vemo-lo sempre mais na linguagem de ódio amplamente usada na internet e nos meios de comunicação social. Às barreiras do ódio, preferimos as pontes da reconciliação e da solidariedade.”

 

Outro fato que mereceu uma menção por parte de Francisco foi o incêndio que destruiu a Catedral de Notre Dame, em Paris, que “mostrou como é frágil e fácil destruir até o que parece sólido” e trouxe à tona o tema dos valores históricos e culturais da Europa. “Num contexto onde faltam valores de referência, torna-se mais fácil encontrar elementos de divisão que de coesão.”

Papa reunido com o corpo diplomático - Foto: Vatican Media

Papa reunido com o corpo diplomático – Foto: Vatican Media

 

África

 

A África ganhou destaque ao fazer memória de suas viagens a Moçambique, Madagascar e Maurício, ressaltando os sinais de paz e de reconciliação. Todavia, o Papa manifestou o seu pesar pela violência e atos de terrorismo em Burkina Faso, Camarões, Mali, Níger, Nigéria, República Centro-Africana e Sudão, inclusive com cristãos pagando com a vida a sua fidelidade ao Evangelho. E mais uma vez manifestou publicamente seu desejo de visitar o Sudão do Sul este ano.

 

Por fim, a viagem à Tailândia e Japão. A atenção se concentrou sobre o testemunho dos hibakusha, isto é, os sobreviventes aos bombardeios atômicos em Hiroshima e Nagasaki. Francisco voltou a repetir que o uso das armas atômicas é imoral e que é possível e necessário livrar-se desses armamentos.

 

Austrália

 

A última nação citada pelo Pontífice foi a Austrália, que vem sofrendo com os incêndios nos últimos meses.

 

“Ao povo australiano, especialmente às vítimas e a quantos vivem nas regiões atingidas pelos fogos, desejo certificá-los da minha proximidade e oração.”

 

Além de se debruçar sobre situações inerentes aos países, o Papa recordou ainda os 75 anos da Organização das Nações Unidas, cujo serviço até aqui foi um “sucesso”, especialmente para evitar outra guerra mundial, mas que hoje necessita de uma reforma geral para torná-la ainda mais eficaz.

 

Mulheres

 

Outra data que inspirou o Pontífice foram os 500 anos da morte do artista italiano Rafael Sanzio, que tinha como um de seus temas preferidos retratar Nossa Senhora. E lembrou que a Igreja celebra em 2020 os 70 anos da proclamação dogmática da Assunção da Virgem Maria ao Céu.

 

“Com o olhar posto em Maria, desejo dirigir uma saudação particular a todas as mulheres, 25 anos depois da IV Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher, realizada em Pequim no ano de 1995, com votos de que em todo o mundo se reconheça cada vez mais o precioso papel das mulheres na sociedade e cessem todas as formas de injustiça, desigualdade e violência contra elas.”

 

Francisco recordou que “toda a violência infligida à mulher é profanação de Deus”, “um crime que destrói a harmonia, a poesia e a beleza que Deus quis dar ao mundo”.

 

Diplomacia

 

A justiça e a paz, finalizou o Pontífice, serão totalmente restabelecidas no final do caminhar terreno. Até lá, a diplomacia é a tentativa humana – “imperfeita, mas sempre preciosa” – para se alcançar esses frutos.

 

“Com este compromisso, renovo a todos vocês, queridos Embaixadores e ilustres convidados aqui reunidos, e aos seus  países, os meus votos cordiais de um novo ano cheio de esperança e repleto de bênçãos.”

 

Bianca Fraccalvieri – Cidade do Vaticano

Fonte: Vatican News

O realismo e a esperança

By | Aconteceu... | No Comments

O realismo e a esperança

 

As palavras-chave do discurso do Papa Francisco ao Corpo Diplomático acreditado junto à Santa Sé

 

No discurso do Papa Francisco sobre a “situação do mundo” deste ano, o que chamou a atenção em particular, foram as palavras dedicadas à crescente tensão entre o Irã e os Estados Unidos. O Papa, que já falara sobre o assunto no domingo 5 de janeiro, reforça o apelo para evitar que aumente ainda mais o conflito mantendo acesa “a chama do diálogo do auto-controle no pleno respeito da legalidade internacional”. Um chamado que vale para todas as partes em causa e que reflete, com realismo, sobre o risco de levar o Oriente Médio e o mundo inteiro em um conflito de consequências incalculáveis.

Felicitações de Ano Novo ao Corpo Diplomático Felicitações de Ano Novo ao Corpo Diplomático - Foto: Vatican Media

Felicitações de Ano Novo ao Corpo Diplomático Felicitações de Ano Novo ao Corpo Diplomático – Foto: Vatican Media

 

Mesmo se hoje, justamente, os refletores estejam apontados na crise EUA e Irã e no ulterior risco que representa para o instável Iraque que sofre com guerras e terrorismo, Francisco não simplifica a realidade. E recorda muitas outras guerras e violências muitas vezes esquecidas. Denuncia a capa de silêncio dobre o destino da martirizada Síria, denuncia o conflito no Iêmen que passa por uma crise humanitária gravíssima na indiferença da comunidade internacional. Cita a Líbia, mas também a violência em Burkina Faso, Mali, Níger e Nigéria. Recorda as violências contra as pessoas inocentes entre as quais também muitos cristãos mortos pela sua fé no Evangelho, vítimas do terrorismo e do fundamentalismo.

 

Não pode deixar de impressionar quem ouviu ou leu a longa e detalhada lista das crises – incluindo as da América Latina causadas por injustiças e corrupção endêmica – o fato que Francisco tenha iniciado o seu discurso com um olhar de esperança, a esperança que para os cristãos é um virtude fundamental, mas não pode ser dissociada do realismo. Esperar, explicou o Papa, exige que se chame os problemas pelo seu nome e que se tenha a coragem de enfrentá-los. Sem esquecer os desastres provocados pelas guerras combatidas há anos e suas devastações. Sem esquecer o absurdo e a imoralidade da corrida ao rearmamento nuclear e o risco concreto da autodestruição do mundo. Sem esquecer a falta de respeito pela vida e a dignidade humana; a falta de comida, água e saneamento que muitas populações sofrem, a crise ecológica que muita gente ainda hoje finge que não vê.

 

Mas pode-se esperar, porque em um mundo que parece condenado ao ódio e aos muros, há mulheres e homens que não se rendem às divisões e não olham para outro lado diante dos que sofrem. Porque há líderes que pertencem a várias religiões que se encontram e tentam construir um mundo de paz. Porque há jovens que buscam sensibilizar os adultos sobre os riscos que corre a criação, porque está indo para um caminho sem volta. Pode-se esperar porque na noite de Belém Deus, Todo Poderoso, escolheu fazer-se menino, pequeno, frágil, humilde, para vencer e conquistar o mundo com o seu amor extraordinário e a sua misericórdia.

 

Andrea Tornielli – Cidade do Vaticano

Fonte: Vatican News